Nota da Anvisa sobre o PL 864/20
No contexto da aprovação do Projeto de Lei (PL) 864/20 pela Câmara dos Deputados, a Anvisa esclarece o que se segue:
A Anvisa, como é função de toda autoridade reguladora de medicamentos, insumos farmacêuticos e dispositivos médicos, é guiada pelo objetivo de promover o acesso da população brasileira a produtos com qualidade, segurança e eficácia, atuando de forma decisiva para a manutenção da saúde.
Aos olhos menos familiarizados com a atuação regulatória, o rito de avaliação dos produtos sujeitos à regulação sanitária no Brasil pode parecer burocrático e, por vezes, mais lento do que o desejado quando a saúde está em risco. Entretanto, é justamente o trabalho criterioso, baseado na melhor técnica e ciência disponíveis no mundo, que garante que o Sistema Único de Saúde (SUS), os serviços de saúde privados e a população brasileira não empreguem seus limitados recursos em produtos com desempenho aquém do esperado e necessário para promover a melhora da condição de saúde.
A Anvisa, por ser autoridade reguladora de referência, com participação ativa nos principais fóruns internacionais de convergência regulatória, partilha do esforço conjunto das principais autoridades reguladoras estrangeiras em desenvolver a regulação necessária aos medicamentos, insumos farmacêuticos e dispositivos médicos, bem como do acesso rápido e responsável das populações a esses produtos.
Ainda nesse esforço conjunto, cabe esclarecer que as realidades de atenção à saúde dos países partícipes dos esforços de harmonização regulatória internacional são distintas, bem como a definição do risco apropriado à realidade de cada país também difere. É por essa razão que muitos produtos aprovados para uso em uma jurisdição têm, com alguma frequência, seu pedido negado em outra.
A regulação da Anvisa é feita por meio de ações pré-mercado e pós-mercado. A etapa pré-mercado inclui o registro de produtos e permite avaliá-los frente aos requisitos nacionais, fortemente alinhados aos padrões internacionais e vinculados à realidade nacional, visando assegurar o atendimento a critérios de qualidade, segurança e eficácia. Nesse processo, a adoção pelo país de medidas que fragilizam a avaliação dos produtos sujeitos à vigilância sanitária é temerária, colocando a saúde da população em risco e inviabilizando a execução de programas de monitoramento após o produto já estar circulando no mercado.
Produtos para a saúde estratégicos para o enfrentamento da Covid-19
Desde o dia 12 de março do presente ano, a Anvisa adotou tempestivamente uma série de medidas de flexibilização e priorização na avaliação de produtos para o enfrentamento da pandemia causada pelo novo coronavírus (Sars-CoV-2). A avaliação de todos os produtos submetidos à avaliação da Anvisa relacionados ao enfrentamento da pandemia foi priorizada pela Agência e o tempo médio de avaliação foi reduzido a poucos dias. Até a data de hoje, foram aprovadas mais de 50 regulamentações e orientações para facilitar o acesso da população a produtos adequados para o enfrentamento da pandemia. Entre essas medidas, com base no conhecimento e na confiança já estabelecidos entre a Anvisa e autoridades reguladoras estrangeiras com equivalência de requisitos e procedimentos, a Agência já havia passado a aceitar avaliações feitas por autoridades reguladoras equivalentes, simplificando e acelerando o processo de autorização desses produtos.
Adicionalmente, considerando a importância de contar com informações fidedignas quanto ao quadro de contaminação no país, de modo a subsidiar a tomada de decisão dos gestores de saúde nacionais, estaduais e municipais, a Anvisa, juntamente com o Ministério da Saúde e o Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), desenvolveu um programa de monitoramento de kits de diagnósticos a fim de averiguar a performance desses kits.
Kits para diagnóstico de Covid-19
Número de kits aprovados desde o início da pandemia: 64.
Número de kits reprovados: 36.
Tempo médio de análise: 12,11 dias.
Principais razões que levam à não aprovação dos kits:
- Instrução processual precária, com ausência de documentos que permitam a avalição da confiabilidade dos resultados e da efetividade diagnóstica do produto (algumas vezes apenas rótulos e instruções de uso).
- Ausência de autorização do fabricante legal para que seja seu representante no Brasil, o que confere segurança quanto às implicações legais brasileiras vinculadas às pessoas jurídicas.
- Ausência ou insuficiência de informações de dossiê técnico, que descreve os elementos que compõem o produto, indicando as características, a finalidade, o modo de uso, o conteúdo, os cuidados especiais, os potenciais riscos, o processo produtivo e as informações adicionais.
- Indicação de uso de amostras para as quais não foram apresentados estudos que indiquem a viabilidade de aplicação da matriz, comprometendo a informação quanto à confiabilidade do resultado.
- Ausência de estudos de sensibilidade e especificidade vinculados à avaliação de desempenho dos produtos.
- Ausência da descrição do produto, ou seja, falta de informações quanto à composição do produto ou sua apresentação comercial.
- Ausência de informações de exatidão e precisão (repetibilidade/reprodutibilidade), sem qualquer justificativa técnica.
Ventiladores pulmonares
Número total de ventiladores aprovados: 162.
Número de ventiladores aprovados desde o início da pandemia: 15.
Número de ventiladores reprovados: 13 (ainda não houve reprovação da Anvisa durante a pandemia).
Tempo médio de análise durante a pandemia: 5,87 dias.
Doenças raras
Em 2017, a Anvisa passou a contar com uma regra específica, por meio da Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 205/2017, para o registro de novos medicamentos e anuência de ensaios clínicos envolvendo medicamentos destinados a tratamento, diagnóstico ou prevenção de doenças raras. Esse marco conferiu maior agilidade no registro de medicamentos para esse tipo de doença, estimulando os laboratórios a conduzirem pesquisas clínicas no Brasil. Em 2018, o prazo de registro de medicamentos para doenças raras foi, em média, de 170 dias, três vezes menor do que para o registro de outros medicamentos.
Cabe esclarecer que, no atual contexto global de esforços para viabilizar o tratamento de doenças raras, com a modernização do marco regulatório brasileiro, o principal gargalo não é regulatório, mas reside nas dificuldades em mobilizar investimentos em pesquisa e desenvolvimento por parte dos laboratórios. A Anvisa somente pode avaliar e autorizar produtos que sejam submetidos à sua apreciação, mas não participa da pesquisa e desenvolvimento desses produtos.